O poema “Solidão” de Vinicius de Moraes reflete uma profunda angústia existencial, marcada pela desesperança e pela solidão. Percorrer o caminho sem esperança, crença e amor, juntamente com um sentimento de incompreensão, simboliza uma total desconexão do mundo e de si mesmo.
Não é simples falar deste tema. Não é por acaso que o tópico da solidão é recorrente na literatura e continua a ser explorado sob diferentes perspetivas. Obras como O Estrangeiro de Camus, A Metamorfose de Kafka, ou O Velho e o Mar de Ernest Hemingway apresentam uma solidão existencial profunda, uma luta interna ou externa pela sobrevivência. Em Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marquez, essa solidão não é apenas individual, mas também familiar e histórica, atravessando gerações.
A solidão é uma experiência profundamente pessoal e, muitas vezes, multidimensional, influenciada por fatores psicológicos, sociais, biológicos e culturais. A ausência de conexão com os outros, a incapacidade de satisfazer a necessidade de pertença e de apoio são aspetos centrais dessa experiência.
Do ponto de vista psicológico, várias abordagens tentam explicar a complexidade da solidão, as suas diferentes formas, causas e consequências. A teoria da vinculação de John Bowlby, ampliada por Mary Ainsworth, sugere que a maneira como formamos vínculos com os nossos cuidadores na infância afeta profundamente os nossos relacionamentos ao longo da vida. Pessoas com estilos de vinculação inseguros podem ter mais dificuldade em estabelecer e manter relações íntimas, o que pode gerar uma sensação persistente de isolamento.
A solidão também pode estar intimamente ligada à ansiedade. Um estilo de vinculação inseguro pode suscitar medo de abandono, intensificando a sensação de solidão. Pessoas com um estilo evitativo, por exemplo, evitam a intimidade emocional, e embora possam não reconhecer conscientemente esse distanciamento, sofrem com a desconexão.
Além das questões relacionais, a solidão pode surgir da incongruência entre o eu real (quem somos) e o eu ideal (quem gostaríamos de ser). Quando essa desconexão é grande, a pessoa pode sentir-se isolada de si mesma e, por consequência, dos outros. Muitas vezes, as pessoas recriam padrões destrutivos, afastando-se emocionalmente ou evitando intimidade por medo da rejeição.
A solidão, portanto, não é apenas uma ausência de contatos sociais, mas uma vivência profundamente subjetiva, como expressa por Clarice Lispector: “Sim, a minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite”. Nessa visão, a solidão pode ser, paradoxalmente, uma fonte de força interior e de autossuficiência.
Seja encarada como uma força, como o nosso maior medo ou uma experiência profunda de tristeza existencial, é essencial reconhecer quando a solidão se transforma em algo incapacitante e procurar ajuda.
Neste mês dedicado à Prevenção do Suicídio, em que saliento as mensagens importantes como não estás sozinho/a e a tua vida importa, recordo a linha SNS24 (808 242 424) e o 112, disponíveis para qualquer situação de crise. Existem ainda as Linhas de Crise e a Linha de Aconselhamento Psicológico.
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